segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Intrigas de Estado - "Tropa de Elite 2", a maior bilheteria nacional


Tudo bem que grande parte da polêmica e divulgação que "Tropa de Elite" teve em 2007 se deu pelo filme ter vazado através de cópias piratas, que logo foram vistas por todo o país. Mas, cá entre nós, era de fato um filmaço: uma das melhores produções brasileiras já feitas, imortalizou um anti-herói genuinamente brasileiro, o Capitão Nascimento, caiu no gosto popular e ainda, de quebra, levou o Urso de Ouro de Melhor Filme em Berlim. Isso é pra poucos. Mas eis que o diretor José Padilha e o roteirista Bráulio Mantovani ousaram o mais arriscado: fazer uma continuação. Eles não só a fizeram, como conseguiram fazê-la superior à primeira parte.

Se no primeiro filme o foco estava nos aspirantes a soldados do BOPE, Neto (Caio Junqueira) e Mathias (André Ramiro), aqui é o Capitão Roberto Nascimento que assume as rédeas da história, toda focada em sua pessoa. Nada mais justo, já que o personagem-narrador já roubara todas atenções para seu personagem antes. E aqui, em "Tropa de Elite 2 - O Inimigo Agora É Outro", Mathias é mero coadjuvante. Acompanhamos Nascimento, agora Sub-Secretário de Segurança do Rio de Janeiro, mais maduro, estratégico e solitário. Separado da mulher e com uma problemática relação com seu filho adolescente, o personagem magistralmente interpretado por Wagner Moura se mostra muito mais humano nesse filme.


A estrutura narrativa desse longa é bem fragmentada, mas acaba formando um eficiente painel de fatos que facilita a compreensão e o envolvimento dos muitos personagens na trama, que dessa vez é focada na ação das milícias nas favelas da cidade. É um assunto polêmico e sério, mostrado de forma crua e fria na tela. Chega a ser brutal a violência mostrada ao longo dos 116 minutos de projeção. Brutal, mas não exagerada ou fictícia. O envolvimento de policiais e políticos denunciados pelo filme é muito próximo da realidade. O grande inimigo, como o título ja adianta, não é mais o tráfico de drogas, e sim o sistema nacional que o permite.

No elenco, quase todos do filme original voltam a fazer seus personagens, como é o caso do já citado Ramiro, com o agora capitão do BOPE Mathias, e de Mihem Cortaz, ainda roubando cenas com seu engraçado e corrupto Fábio. Irandhir Santos desempenha um excelente trabalho como o defensor dos direitos humanos Diogo Fraga, muito bem elaborado para o longa. Mas o destaque absoluto vai para Sandro Rocha, que desempenha o papel do traiçoeiro e violento Russo, responsável pelas milícias. Apesar de já ter feito uma ponta com o mesmo personagem no filme anterior, é aqui que Rocha tem espaço para, com seu misto de cinismo, frieza e agressividade, despertar fúria e ódio em qualquer espectador, em um papel que pode deixá-lo marcado no cinema nacional. André Mattos está hilário no papel do apresentador sensacionalista Fortunato, que logo vira deputado federal, em um personagem muito inspirado na figura do apresentador (e também deputado, olha que coisa) Wagner Montes. Vale ainda lembrar que o cantor Seu Jorge faz uma rápida participação no começo do filme, mas sinceramente, não é nada memorável...


Não faltam cenas e falas memoráveis ao longa, que devia ter sido o indicado brasileiro para concorrer ao Oscar ano que vem. Até porque, cá entre nós, tem muito mais chances de ganhar do que "Lula, o Filho do Brasil", escolhido (por motivos óbvios) pela Secretaria de Cultura para ser o nosso representante. Mas a grande cena que merece ficar latente na memória de todos que assistirem ao filme é aquela em que Nascimento resolve combater o sistema, ao qual agora estava inserido, com as próprias mãos. Não à toa, é o momento em que aplausos rompem a escuridão em plena sala de cinema, uma cena tão urgente e bem executada que por si só já valia um Oscar para Moura e outro para Padilha.

Com menos cenas focadas na ação imediata das forças de ataque do BOPE, temos aqui um redirecionamento do ambiente para os gabinetes políticos dos governadores e chefes de Estado, mostrando sua direta ligação com o tráfico. Ao mostrar esses contatos, o filme faz uma denúncia quase direta do que acontece no Rio e no Brasil, realmente apenas mudando o nome dos envolvidos. É um verdadeiro soco na cara da política brasileira, um ato de imensa coragem do diretor e dos envolvidos na realização. Um filme que deve por isso ser visto por todos, o que tem acontecido até agora, visto que em 2 semanas já tinha passado a barreira dos 2 milhões de expectadores, se tornando recorde de público na Retomada. Quem gostou do primeiro, vai simplesmente amar esse.


Antes de ser a sequência de um filme de grande sucesso, "Tropa de Elite 2" é um verdadeiro manifesto daqueles e para aqueles que acreditam que, com denúncias como essa, o país pode sim reconhecer seus erros e mudar. Ao final da projeção, ao som de "O Calibre", dos Paralamas do Sucesso, a sensação de impotência e impunidade é grande e incômoda. E é exatamente esse sentimento que o diretor e sua equipe buscam despertar em cada um de nós, a fim de promover alguma mudança através de seu cinema. Mais triste, entretanto, é saber que não existe um Capitão Nascimento para nos salvar.

sábado, 2 de outubro de 2010

Crepúsculo dos Deuses: Arthur Penn (1922-2010) e Tony Curtis (1925-2010)

Após a morte de Dennis Hopper, eis que o tempo leva mais dois grandes símbolos de Hollywood, com a morte do diretor Arthur Penn no último dia 28 de setembro sendo logo seguida da do ator Tony Curtis, no dia 30. Mas você, caro leitor, deve estar se perguntando: "Quem são esses caras? NUNCA ouvi falar deles!". Sinceramente, duvido muito.


Para os que não reconhecem o nome de Arthur Penn, nada mais justo do que lembrá-lo pelo filme que o deixará imortalizado na história do cinema: "Bonnie e Clyde - Uma Rajada de Balas", que em 1967 simplesmente mudou o jeito de se fazer filmes em Hollywood. A história real do casal de bandidos (vividos com intensa paixão por Faye Dunaway e Warren Beatty, respectivamente) que com sua gangue levou terror e medo ao interior dos EUA nos anos 1930 ganhou um tratamento inovador para a época, com grande violência visual e realismo. Além disso, se destacou por mostrar essa dupla de ladrões como pessoas inocentes sem rumo na vida, sem o então esperado rótulo de "malvados" ou "mal exemplo". Uma obra-prima inquestionável.

A partir do estilo inaugurado com esse filme, no final dos anos 70, o cinema de Hollywood foi tomado por diretores e atores com o mesmo ponto de vista rebelde, como o também falecido e antes citado Hopper, na famosa geração "sexo, drogas e rockn'roll" que gerou obras-primas como "Sem Destino", "Taxi Driver" e "O Poderoso Chefão". Sem esse primeiro e arriscado passo de Arthur Penn, isso não seria possível.


Mesmo sendo sempre ligado apenas a essa produção, Penn fez outros grandes filmes, como "Pequeno Grande Homem"(1970), com Dustin Hoffman, e "Caçada Humana"(1966), com Marlon Brando e Robert Redford. O seu jeito de interagir com os atores, permitindo que eles se envolvessem totalmente no processo de criação dos personagens e na história, fez com que ele fosse muito querido por todos que tiveram a sorte de trabalhar com ele. Apesar disso, a ousadia nos temas e abordagens de seus filmes fez com que os grandes estúdios o deixassem de lado, o que o levou a realizar seus últimos trabalhos para a TV. Morreu um dia depois de completar 88 anos, mas não antes de ser agraciado em 2007 no Festival de Berlim, onde recebeu o Urso de Ouro Honorário por sua contribuição ao cinema. Uma homenagem tardia, mas muito mais que merecida.


Já Tony Curtis, cujo verdadeiro nome era Bernard Schwatz, ficou marcado como um dos grandes galãs da Era de Ouro de Hollywood, nos anos 50. E até a última quinta-feira, era um dos poucos ainda vivos.


Mais famoso por papéis cômicos, o auge de sua carreira foi e sempre será o filme "Quanto Mais Quente Melhor", comédia do diretor Billy Wilder que é considerada pela Academia das Artes Cinematográficas como a melhor já feita. E é de fato muito engraçada essa produção de 1956, que trazia Curtis e o grande Jack Lemmon encarnando dois amigos músicos que, após testemunhar um massacre entre mafiosos, são obrigados a se disfarçar de mulheres de um grupo de música para fugir dos vilões. Esse foi também o último grande trabalho do mito Marilyn Monroe, que já tinha sua beleza um pouco desgastada pelo vício em remédios e bebidas. Após uma cena romântica com a atriz, ele chegou a dizer para a imprensa que "Beija-la era como beijar Hitler", declaração quer causou polêmica. Incrível ver que mesmo tendo mais de 50 anos, o longa se mantém engraçado, com piadas um tanto ousadas ligadas à sexualidade, que escandalizaram na época e ainda hoje provocam gargalhadas.

Após se imortalizar nesse filme, Curtis foi indicado ao Oscar em 1958 pela magnífica atuação no filme "Acorrentados". Sua versatilidade e talento ainda puderam ser vistos em produções como "Spartacus" e "O Homem que Odiava as Mulheres". Na TV, fez sucesso ao lado de Roger Moore (terceiro ator a encarnar o agente 007, principalmente na década de 70) na série "The Persuaders", como um agente secreto playboy.

Com o tempo, sua carreira entrou em declínio por sérios problemas com álcool e cocaína, e seu sucesso nunca mais foi o mesmo. O ator foi casado 6 vezes, tendo sido o casamento mais famoso o que teve com a atriz Janet Leigh, imortalizada por seu papel em "Psicose", de Alfred Hitchcock, no qual era morta no chuveiro. Com ela, o ator teve uma filha que herdou o talento de ambos: Jamie Lee Curtis, famosa pela série "Hallowen" e por filmes como "Um peixe chamado Wanda" e o mais recente "Sexta feira muito louca".


Sumido das telas por um bom tempo, a última grande homenagem ao ator fora um episódio especial da série "CSI: Las Vegas" dirigido pelo grande Quentin Tarantino em 2005. Apesar da saúde já frágil por problemas cardíacos, o ator lançara ano passado uma autobiografia chamada "American Prince". Foi-se aos 85 anos, já sem o brilho dos velhos tempos. Mas a imagem que ficará na memória é a do jovem galã de voz grave e cabelo negro cintilante que, sem muito esforço, divertia e comovia seus fãs.

Enfim, dois gigantes dos tempos áureos de Hollywood que agora nos deixam, para ficarem para sempre na história do cinema.

domingo, 5 de setembro de 2010

Comandos em Ação - Muitas explosões com "Os Mercenários"


Quando Sylvester Stallone anunciou que dirigiria um filme de ação com a cara dos anos 80 e reunindo o time de atores que marcaram o gênero na época, muitos acreditavam que estava em produção o melhor longa de ação já feito. A cada grande nome que entrava no projeto, os contornos épicos iam aumentando na divulgação, a começar pelo nome. Mas, no fim das contas, "Os Mercenários" ("The Expendables", no original), nada mais é que uma grande brincadeira, um prato cheio para quem curte ação desenfreada sem muita explicação e uma grande bobagem para quem espera algo mais.

Depois de voltar aos holofotes revivendo seus antigos personagens em "Rocky Balboa"(2006) e "Rambo IV"(2008), Stallone entendeu que a boa era investir no que sabia fazer melhor, repetindo as fórmulas que o levaram ao sucesso no passado. Assim, nada mais justo do que investir no gênero que fez sua fama. Na nova produção, a história é simples: Stallone é Barney Ross, o líder de um grupo de mercenários que realiza qualquer missão desde que ela seja bem paga. Entre seus companheiros estão nomes como Jet Li, Dolph Lundgren, Terry Crews e Jason Statham (esse representando a nova geração de astros musculosos), que juntos tem a missão de derrubar o general Garza (David Zayas), ditador da ilha de Vilena.


Mas como era de se esperar, a "trama" é apenas uma desculpa para muitas cenas envolvendo tiros, sangue, correria e explosões... muitas explosões. Na verdade, tudo explode nesse filme: carros, helicopteros, até pessoas. E não precisam de explicação para isso, apenas explodem, mas é aí que está a graça do filme, provavelmente. Afinal, é quase um filme trash, que comete o erro de se levar muito a sério em certos momentos. Mas o grande problema é que as cenas de ação são pouco inspiradas e sem criatividade, não havendo nenhuma verdadeiramente antológica, algo imperdoável para um filme desse calibre e proporção. Vemos apenas muita pancadaria já vista antes em outros filmes. A única cena que fica na memória é a entrada (triunfal, diga-se de passagem) do engraçado personagem de Terry Crews em um intenso tiroteio acontecendo em um corredor. Explosiva, diga-se de passagem.

No meio de tanta adrenalina e testosterona, vale a pena destacar a participação da brasileira Giselle Itiê como Sandra. A atriz consegue ter bastante tempo em cena, com mais falas do que Rodrigo Santoro na grande maioria de seus filmes estrangeiros. Um talento brasileiro que pode ser descoberto no exterior através desse filme. Mickey Rourke também dá as caras, em um papel sem nenhuma importância na história. Na verdade, ele, Li e Lundgren só estão ali para dar mais peso ao elenco e proporcionar mais cenas de luta, pois os únicos personagens relevantes são os de Stallone (que consegue manter a mesma expressão facial - nula - durante todo o filme) e Statham (esse sim, o único ator com carisma do elenco), que sozinhos dariam conta do recado. Como vilão, há ainda a presença de Eric Roberts com seu jeito canastrão de sempre, que ajuda a dar o clima ao filme.


Todos os comentários e polêmicas se voltaram para a rápida (põe rápida nisso) participação de Bruce Willis e Arnold Schwarzenegger em uma improvisada cena. É de fato engraçada e memorável, mas longe de ser antológica. Não vale a pena assistir o filme por ela. Na verdade, só vale a pena assisti-lo quem for fã dos clássicos filmes de ação dos anos 80, que popularizaram não só os membros do elenco, mas também Jean Claude Van Damme - que recusou participar do longa por achá-lo sem profundidade (!!) - e Chuch Norris. Esses fãs, sim, terão 100 minutos de diversão ao som de muitos tiros e... explosões.

domingo, 22 de agosto de 2010

Império dos Sonhos - "A Origem", o filme do ano


Christopher Nolan conseguiu. Depois de brindar a sétima arte com verdadeiros filmaços como "Amnésia"(2000), "O Grande Truque" (2006) e com os dois mais recentes filmes do Homem Morcego ("Batman Begins" (2005) e "O Cavaleiro das Trevas" (2008)), ele se supera ao criar uma verdadeira obra-prima moderna. Com um roteiro original escrito por ele mesmo e efeitos incríveis usados de maneira inédita e bem pensada, "A Origem" ("Inception", no original) é sem dúvida o melhor filme do ano, pelo menos até agora.

O trailer mostrava cenas deslumbrantes sem esclarecer muito da complexa trama, que aborda a mente humana e seus sonhos. E é graças à essa complexidade narrativa que o filme se torna uma fascinante e inesquecível experiência. O fio principal é que para roubar uma ideia é preciso fazer uma pessoa sonhar com ela. O sonho tem de ser cuidadosamente planejado e executado, o que exige um arquiteto e um conjunto de profissionais que torne isso possível. E é aí que entra o grupo de Cobb (Leonardo DiCaprio, em um papel muito parecido com o do recente "Ilha do Medo"), especialistas
em extrair idéias do sonho das pessoas, que nesse caso tem o desafio de fazer uma inserção (daí o título) ao invés de uma extração.

Se DiCaprio é a grande estrela da produção, não deve ser o único a levar os elogios, uma vez que todos os atores realizam um grande trabalho. Cillian Murphy marca presença como a vítima do "golpe" em seu terceiro trabalho com o diretor (ele fizera os dois filmes do Batman como o vilão Espantalho), Ellen Page (eternizada como Juno em 2007) prova seu grande talento na pele da novata Ariadne, Joseph Gordon-Levitt (visto em "500 Dias Com Ela") mostra que não é apenas um ator indie e consegue se virar muito bem numa superprodução com seu estiloso Artur e Marion Cotillard dá sua suavidade a uma personagem chave. Mas a grande surpresa e destaque é Tom Hardy, muito à vontade na pele de um tipo de "mestre dos disfarces psicológico", o truculento Eames. A presença da francesa Cotillard no elenco talvez explique o uso insistente da música de Edit Piaf no desenrolar do processo, como uma menção ao papel que deu o Oscar à atriz em 2007.


Nolan mostra que é um dos melhores diretores da atual safra americana ao manter o total controle narrativo de uma complicada história que se desenvolve em diferentes camadas e realidades. O trabalho de edição também merece reconhecimento, pois consegue organizar a aparente desordem psicológica e permite assim a compreensão do espectador sem confundi-lo mais do que o necessário. Um Oscar nesta categoria seria mais que merecido.

O filme, como esperado, tem cenas simplesmente espetaculares, que possuem maior impacto na tela grande do cinema. Os efeitos visuais não ditam o ritmo da produção, mas são usados sabiamente para compor cenas que dificilmente são esquecidas depois do término da projeção. As melhores cenas são as protagonizadas por um Gordon-Levitt em gravidade zero, lutando sozinho contra vários seguranças em um prédio em movimento enquanto um sonho se desmorona (foto abaixo). Algo muito complexo para se explicar por aqui, mas que merece um lugar cativo na memória do público. Uma cena que nasceu para ser antológica.


Com toda a estrutura de filme alternativo, "A Origem" consegue ganhar porte de blockbuster graças aos nomes do elenco e ao grande orçamento. O longa tem tudo para agradar gregos e troianos, com muita ação, suspense e efeitos especiais e até alto grau de reflexão. Ou seja, entretenimento da melhor qualidade.

O objetivo do diretor e do seu longa não é dar respostas, e sim elaborar as perguntas visualmente. Ouso dizer que se o filme tivesse sido feito e lançado 5 anos atrás, causaria uma revolução no cinema semelhante à de "Matrix" no início do século. Afinal, é sempre bom sair do cinema questionando o que é, afinal de contas, real ou fruto de nossa imaginação.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Inimigo Público Nº1 - Vilão rouba o filme em "Meu Malvado Favorito"


Quando o novo estúdio de animação Illumination Entertainment anunciou o projeto de um filme que teria como protagonista um vilão que pretende roubar a Lua, as espectativas em torno de uma produção com toques sombrios e muito humor negro, no estilo Tim Burton, ficaram grandes. Bem, não é exatamente isso que assistimos nesse "Meu Malvado Favorito" (Despicable Me, no original).

Antes de mais nada, é bom deixar claro que o filme não é ruim, longe disso. Mas ao analisarmos o roteiro e o personagem principal, acreditamos que o resultado podia ter sido melhor. O (ironicamente) carismático Gru, com seu visual que remete ao Tio Chico (Uncle Fester) da "Família Addams", é uma ótima síntese de todos os vilões desengonçados e fracassados que conhecemos, podendo com justiça fazer parte do hall de grandes personagens criados pela animação cinematográfica. Ponto para Steve Carell, que o dubla no original, e para Leandro Hassum, que imprime um estilo único ao personagem na versão nacional.

Na história, o vilão tem que lidar com três órfãs, que estão sob os seus cuidados e não podem ser abandonadas. Como essas 3 pequenas são um tanto clicherizadas e apáticas (menos a caçula Agnes, que consegue se destacar bastante), os pequenos e estranhos ajudantes amarelos do malvado, usados fartamente na divulgação do longa, acabam sendo o ponto alto do filme. Mas ao mesmo tempo em que são deles as tiradas mais engraçadas e inspiradas, em alguns momentos eles interrompem a narrativa em partes claramente voltadas para o público mais infantil, acresentando pouco à trama. Mesmo assim, ou talvez por causa disso, será difícil alguém sair das salas de cinema sem ter sido conquistado por eles.


Diferente de outras animações recentes, como "Toy Story 3" e "Shrek para Sempre", essa faz um uso mais evidente e gritante da tecnologia 3D, com direito a muitos objetos jogados e mãos em direção à tela. Isso até garante maior diversão para quem assiste o filme nesse formato, mas enfraquece seu impacto no 2D tradicional.

O problema que pode ser notado já na metade da projeção é que todo charme e carisma se concentram em Gru e seus ajudantes, com personagens secundários pouco memoráveis, como o irritante antagonista Vetor (que acaba desperdiçando uma inspirada dublagem de Marcius Melhem). Assim, o protagonista e os amarelinhos têm que levar o filme sozinhos em suas costas. Talvez por isso o personagem seja um pouco corcunda.
Apesar desses pequenos pontos negativos e do excesso de pieguice na parte final, o filme tem ótimos momentos pelos quais merece ser (e será) lembrado.

terça-feira, 13 de julho de 2010

Missão Impossível: Tom Cruise e Cameron Diaz voltam para um "Encontro Explosivo"


“Então Jimmy, você é um diretor que já tem certo prestígio no meio cinematográfico por seus filmes anteriores, e agora nós achamos que está na hora de você brincar de cinemão, utilizando todos os exageros que uma grande produção pode proporcionar. Topa?"
Provavelmente foi assim que os produtores de "Encontro Explosivo" (Knight and Day, no original) convidaram James Mangold para assumir a direção desse filme que tem como finalidade, antes de mais nada, promover e catapultar novamente seus protagonistas para o topo das bilheterias.

Tom Cruise está em busca de um novo sucesso de bilheteria há certo tempo, principalmente depois do injusto fracasso comercial do interessante "Operação Valquíria", de 2009. O astro viu potencial nesse roteiro em que é um agente secreto que protege a chave de uma infinita fonte de energia. Afinal, essa era a grande chance dele brincar de James Bond sem fazer alusão à franquia "Missão Impossível", que o consagrou no passado. Chris Tucker, Adam Sandler e Gerard Butler foram considerados para o papel principal antes de Cruise fechar contrato.

Como não podia deixar de ser, ele acaba se envolvendo com uma bela mulher no meio da missão. E assim temos Cameron Diaz, que nos últimos anos tem como maior sucesso a série Shrek, na qual dubla Fiona, também tentando obter mais um ponto alto na carreira. O problema é que a atriz parece repetir o mesmo tipo de personagem que sempre faz em seus filmes, cada vez mais restritos a comédias românticas bobinhas. Sem dúvida consegue até divertir em certas cenas, mas sem apresentar nada novo. Assim, o público sabe exatamente o que esperar dela em cena.


O filme em si, ao longo de seus 115 minutos, é bastante previsível, e fica nos espectadores a impressão de que tudo aquilo já foi visto anteriormente. O personagem um tanto canastrão de Cruise parece ser indestrutível em quase todas cenas frenéticas de ação que permeiam o longa. E dá-lhe tiros, explosões, situações absurdas e batidas de carro. O roteiro só serve como escada para os protagonistas falarem piadas prontas e viajarem para cenários exóticos. Embora o longa tenha sido filmado, principalmente, em Massachusetts, seis dias de filmagens ocorreram em Salzburgo, na Áustria. Algumas filmagens extras também foram feitas na Andaluzia, Espanha, Port Antonio, Jamaica e em Los Angeles, Califórnia.

No fim das contas, o público encontra um filme que é apenas leve entretenimento, para uma tarde descompromissada com amigos no shopping. Quem busca algo além disso, sem dúvida, sairá decepcionado do cinema. Parece que recuperar o prestígio dos velhos tempos tem sido uma verdadeira missão impossivel para Tom Cruise.


É verdade que esse é o trabalho menos inspirado de James Mangold, mas isso não deve afastar os olhos do público do talento desse americano que já realizou bons filmes em pouco mais de 10 anos de carreira. Ele começou na direção com o policial "Cop Land"(1997), mas ganhou projeção com "Garota Interrompida", de 1999, filme que deu o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante para uma ainda rebelde Angelina Jolie.

Depois de dirigir o romântico "Kate & Leopold"(2001) e fazer uma participação como ator no filme "Tudo Para Ficar Com Ele"(2002), ele voltou aos holofotes com a premiada cinebiografia do polêmico cantor country Johnny Cash no excelente e premiado "Johnny e June", filme de 2005 que ganhou o Globo de Ouro de Melhor Musical ou Comédia e que deu o Oscar de Melhor Atriz para Reese Witherspoon, no emocionante desempenho como June Carter, alma-gêmea de Cash, que é magistralmente vivido por Joaquim Phoenix, que só não levou o Oscar naquele ano pois seu concorrente era Philip Seymour Hoffman, que encarnara perfeitamente Trumam Capote no filme que leva seu sobrenome. Mas com total domínio da câmera nesse filme, Mangold deixou claro seu talento. Depois desse grande filme, ele ainda fez o eficiente western "Os Indomáveis" em 2007, um remake do filme "31 to Yuma" realizado em 1957. Assistindo a esses filmes, vemos começo promissor de um ainda novato diretor, que pode realizar belos filmes no futuro, principalmente se nao continuar escolhendo projetos preguiçosos como esse "Encontro Explosivo".

segunda-feira, 5 de julho de 2010

O Diretor Fantasma - Filme terminado por Polanski na cadeia chega aos cinemas


Em 27 de setembro de 2009, a convite do Festival de Cinema de Zurique, Roman Polanski viajou à Suíça para receber um prémio pela sua carreira cinematográfica, pontuada por grandes clássicos como "O Bebê de Rosemary"(1968) e "Chinatown"(1974). Surpreendentemente, acabou sendo preso pelas autoridades helvéticas sob a alegação de que um mandado internacional de prisão contra ele estava em vigor, devido à condenação por "relação sexual ilícita com uma menor de 13 anos", crime ocorrido em 1977 que ele mesmo assumiu ter cometido, sendo desde então um foragido, o que o fizera fugir dos EUA e se exilar na França.

Polêmicas à parte, o fato é que durante tudo isso, antes da prisão, o diretor franco-polonês estava rodando um novo filme, "O Escritor Fantasma" ("The Ghost Writer", no original), um thriller político protagonizado por Ewan McGregor. Na história, um ghostwriter (pessoa que escreve textos e livros assinados por outros), vivido por McGregor, é contratado para completar as memórias de Adam Lang (Pierce Brosnan, tentando ainda se livrar da imagem de ex-James Bond), primeiro-ministro da Inglaterra. Mas claro que as coisas começam a se complicar e logo o escritor acaba descobrindo segredos sobre uma conspiração mundial que coloca sua própria vida em perigo.


O roteiro, surpreendente, atual e muito bem pensado, representa e retrata de forma eficiente os atuais escândalos políticos que acontecem diariamente ao redor do mundo envolvendo figuras marcantes do poder. A abordagem é extremamente realista, e o personagem de Brosnan, aqui com uma atuação iluminada, tem clara inspiração na figura de Tony Blair, primeiro-ministro do Reino Unido entre 1997 e 2007.

Com seu grande talento em conduzir histórias com muitos desdobramentos, Polanski (que ganhou o Oscar de Direção em 2002 por "O Pianista") nos joga no centro da ação, conseguindo manter um clima de tensão crescente. A produção apresenta uma estrutura bem característica de seus filmes. Logo no começo da projeção, a ausência de créditos iniciais já é percebida. Mas o grande diferencial é que se trata de um filme com estrutura, estilo e visual europeu, mas com elenco de grande produção americana. Algo que só Polanski conseguiria, e aqui conseguiu de novo, mesmo com a edição final sendo feita já após sua prisão. O resultado foi o Urso de Prata de melhor direção no Festival de Berlim deste ano.


Todo o elenco se sai muito bem numa trama onde nada (nem ninguém) é exatamente o que parece. McGregor, que é um grande ator por natureza, como já provou em "Trainspotting"(1996) e na nova trilogia de "Star Wars", entre outros filmes, leva toda a historia com um inspirado desempenho em cena. Tom Wilkinson, como sempre, consegue roubar algumas cenas no discreto e pequeno papel do Dr. Paul Emmett. Olivia Williams também chama a atenção como a sofrida mulher de Lang. Outro destaque é Eli Wallach, ator veterano de filmes como "Três Homens em Conflito"(1966) e "Os Desajustados"(1960), aqui aos 94 anos em uma rápida participação como um senhor que é testemunha da cena do crime que dá início à trama.

Apesar do título de filme de terror, "O Escritor Fantasma" é um suspense que se em certas partes apresenta um ritmo um tanto parado e sombrio, consegue ganhar todo o público com seu inesperado e genial final. É a prova de que Polanski, cineasta, produtor, roteirista e até ator em certas ocasiões (como em seus próprios "Chinatown" e "A Dança dos Vampiros"(1967)), ainda mantém seu estilo único aos 76 anos de idade. Provavelmente tal frieza vista em seus trabalhos seja resultado de uma sofrida vida pessoal, na qual perdeu a mãe e a irmã em um campo de concentração na Segunda Guerra Mundial e teve sua esposa (e musa), a atriz Sharon Tate, brutalmente assassinada quando estava grávida em 1969 pela gangue do psicopata Charles Manson, num dos mais famosos e bárbaros crimes da história criminal americana. Nesse caso, os traumas ajudaram a construir um gênio.

terça-feira, 22 de junho de 2010

Os Bons Companheiros - Pixar volta às origens com a franquia "Toy Story"


Já se passaram 15 longos e rápidos anos desde que o estúdio de animação da Pixar resolveu produzir um filme inovador completamente feito com computação gráfica. Desse projeto, nasceu o adorado "Toy Story" (1995), que apesar do que muitos acreditam, não foi o primeiro longa-metragem computadorizado a chegar aos cinemas. Esse mérito é do brasileiro "Cassiopéia", finalizado e lançado pela produtora NDR Filmes meses antes da produção americana. Mas polêmicas e detalhes à parte, Woody e seu companheiro Buzz Lightyear voltam com tudo para a esperada terceira parte, lançada mundialmente em tecnologia 3D.

Passados 11 anos desde a bem sucedida segunda parte das aventuras da trupe de brinquedos que ganha vida quando seus donos não estão prestando atenção, muito se especulou sobre uma possível sequência, onde os brinquedos teriam que lidar com o amadurecimento de seu dono. John Lasseter, mago por trás da Disney-Pixar que dirigira os dois primeiros filmes, resolveu dessa vez apenas produzir o longa (dirigido por Lee Unkrich) que lida exatamente com esse assunto, mostrando Woody (dublado mais uma vez pelo grande Tom Hanks) e seus amigos tendo que aceitar a ida do agora crescido Andy para a faculdade. Para piorar, são acidentalmente mandados para uma creche, onde encontram novos brinquedos e têm que lidar com crianças descuidadas.


Apesar de ter uma abordagem mais séria e (erro?) adulta que seus antecessores, "Toy Story 3" parece feito sob medida para os fãs, dando a devida importância para os vários adorados personagens que conquistaram as crianças (e também os pais delas, como não?) na década passada. A história é desenvolvida de forma leve e direta ao longo dos 103 minutos de projeção, que fazem desse o filme mais longo da trilogia. Não que isso seja ruim, uma vez que o carisma dos personagens e a dinâmica das cenas fazem tudo passar muito rápido.

Como não podia deixar de ser, vários são os novos personagens a dar as caras, mas o destaque fica sem dúvida para o clássico casal Barbie e Ken (esse dublado na versão original pelo sumido Michael Keaton), muito bem representados e parodiados na tela. Embora o humor esteja presente em uma dose menor que nos antecessores e Woody e Buzz estejam mais distantes e separados em cena, algumas piadas são impagáveis, como uma que envolve uma mudança na configuração de Buzz, que é novamente dublado pelo comediante Tim Allen.

Os avanços tecnológicos sempre esperados do estúdio de animação de maior prestígio do mundo não se fazem presentes nos traços dos bonecos, que continuam aqui exatamente iguais, afinal, são bonecos. Essa superioridade gráfica aparece de forma mais discreta, sendo melhor percebida nos cabelos dos humanos, dos bichos de pelúcia e do cachorro. Os cenários se mostram também melhor trabalhados e detalhados.


Como em qualquer produto com a marca Disney, há também aqui muitas cenas comoventes e emocionantes, que podem levar os mais emotivos as lágrimas. Ao fim da projeção, fica um certo clima de capítulo final no ar, mas como o filme tem arrecadado muito bem ao redor do mundo, é possivel que os produtores se rendam e invistam em mais uma aventura no futuro. Caso isso não ocorra, pode-se dizer que a trilogia foi fechada com chave de ouro. Ao retornar às origens de seu primeiro longa animado, a equipe responsável por Toy Story possibilitou que jovens como eu pudessem, pelo menos por pouco mais de uma hora e meia, retornar à infância, um tempo que será sempre lembrado como aquele que passamos com os bons companheiros que foram nossos brinquedos.