"Bete Balanço" é um filme plenamente consciente de seu apelo, seu público, seu tempo. Planos lindíssimos e casamento maravilhoso entre Som & Imagem, orgulhosamente POP & jovem - inclusive no sentido experimental da proposta. Dá pra perceber em cada plano/corte um jovem cineasta em busca de novas linguagens e estéticas com seus carismáticos amigos-por-acaso-atores. Suspeito que se fosse com sotaque francês ou inglês, o impacto a longo prazo seria outro, o selo de "cult" garantido... Não há nada ali para se envergonhar ou desviar os olhos. Um retrato fascinante de um estado de espírito. Cores pulsantes e ritmo frenético, ao som das "novidades do momento". Barão Vermelho, Lobão, Celso Blues Boy, Titãs, cada trilha parece escrita especialmente pro filme. É narrativa, é tom, é clima. É diversão, pra balançar sem culpa.
Queria aproveitar essa análise mais profunda para deixar aqui alguns !!!!!!!!!! para o mulherão é Déborah Bloch. Vish. Ela tinha apenas 20 anos quando topou o papel-título, mas bancou a missão com carisma e presença. Uma protagonista feminina super ativa e ousada, que toma as rédeas de todas as ações determinantes no roteiro. Faz o que bem quer, do jeito que bem quer, inclusive nos momentos de tensão sexual e num ousadíssimo romance escancarado com a sofisticada diva Maria Zilda. Era beijo na boca e cena na cama pós-sexo entre duas mulheres num filme jovem e popular dos anos 80 ! Nada de cult pro circuito dos festivais: era filme jovem e livre pra fazer sucesso - e fez! Sem falar que a Bloch solta a voz pra valer. A cena em que ela e o Cazuza descobrem a melodia de "Amor Amor" juntos é de arrepiar olhos e ouvidos. A maconha ali bem enquadrada entre os dedos era 0% vulgar, não era apologia, era uma câmera quase documental, modestamente captando aquela época tal como ela era. Eu poderia apostar que se a Déborah Bloch fosse estrela de um filme desses em outros cantos do mundo, imediatamente lançaria discos e carreira musical paralela. Por aqui, o timbre seguiu abafado.
Falando nisso de "captar uma época", esse "Bete Balanço" consegue até ser um trágico retrato de toda uma geração. Ali estão Lauro Corona e Cazuza no auge da juventude . Os dois já não existiriam uma década depois. O maior galã e o maior poeta daquela geração, precoces vítimas da AIDs - o primeiro em 1989, o segundo em 1990. Quando eu surgi em 1992, o astro, o compositor-ícone e o diretor desse filme que transpirava Juventude já não estavam aqui. E agora chegam tão perto.
Por fim, pulsa alto certo alívio de que uma figura tão expressiva, carismática e icônica quanto Cazuza tenha sido captado no auge por uma câmera tão estética e cuidadosa. Sua participação é pontual, mas não permite indiferença. Quem não o conhecia até ali, não poderia deixar de conhecer a partir do final da sessão. O filme acaba, a música-título continua. E ainda toca, quase 40 anos depois, bem alta e jovial. Quem tem um sonho não dança .