sexta-feira, 29 de junho de 2012

Perdidos no Espaço - Os Altos e Baixos de "Prometheus", Volta de Ridley Scott ao Universo de Alien


É difícil falar de um filme como "Prometheus". Para começar, eu sempre fui um grande fã de "Alien - O Oitavo Passageiro", obra-prima que revelou o diretor Ridley Scott para o mundo e redefiniu (pelo menos visualmente) a ficção científica. Por isso, não gostei NEM UM POUCO quando anunciaram mais uma continuação - que, na verdade, é um prelúdio do original. Ainda mais quando descobri que o próprio Scott iria assumir o comando novamente - ele não dirigiu nenhuma das continuações, só fez o original. É bem o tipo de coisa que ou dá muito certo, ou muito errado. E fã que é fã sempre prefere evitar o risco da segunda opção, adotando a postura do "deixem o clássico quieto!". Mas enfim, já que fizeram, é preciso ver o resultado. E lá fui eu.

A regra é clara: se você gosta do filme original - e não do personagem Alien em si -, tem tudo para assistir grande parte do filme muito feliz. Começando pelos líricos créditos iniciais e bonitos passeios pela nave com o andróide David, a primeira hora de filme nos faz acreditar que Scott fez tudo certo. Ao mesmo tempo em que parece um tributo ao original, apresenta uma história nova e envolvente. Para situar todo mundo, voltemos rapidamente ao clássico de 1979: quando os cientistas entravam no estranho planeta repleto de ovos do que seriam aliens, eles passavam por uma estranha carcaça gigantesca (na foto abaixo, em uma imagem do original). Além do visual interessante e inovador, aquele "ser" nada adicionava à história, apenas estava lá. Pois ele foi o ponto do qual Scott espertamente traçou uma nova história. E era, de fato, algo novo à mitologia que ele mesmo ajudou a criar.


Os cenários, personagens, paisagens... À princípio, tudo remete à estética original projetada por H.R. Giger para aquele fascinante universo. E isso é bom, perfeitamente aliado ao efeito 3D. Se existe um gênero perfeito para o uso da terceira dimensão, é a ficção científica - afinal, a ideia é ficar imerso em um ambiente completamente diferente e "novo". A trilha sonora composta por Marc Streintenfeld é sci-fi por excelência: mantém o clima de suspense e não pesa na dramaticidade das cenas. Resumindo, técnica e esteticamente o filme é sensacional e Scott ainda é mestre em ambientação.

O problema está no modo como a trama se desenvolve. Leia-se: a segunda metade do filme.  O andamento e ordem das cenas é muito semelhante ao filme que Scott dirigiu 33 anos atrás - é, o tempo passa! Só que a graça antes era o fato de muito pouco ser mostrado, e apenas em cenas chave. Isso criava uma sensação absurda de suspense e dava aquele frio na espinha cada vez mais raro de se sentir no cinema. Aqui, há fartura de cenas. Muitas explicações, muitos diálogos inúteis, muitos personagens desnecessários, muita coisa acontecendo de forma corrida. E isso para no final sobrarem muitas dúvidas no ar. Não é das melhores equações.


Ninguém precisa mais sair por aí falando do talento de Noomi Rapace, já ficou bem claro que ela tem. Mas sua personagem está longe de ter o carisma da Ripley de Sigourney Weaver. Ela chega até a evocar sua bravura em uma cena tão chocante quanto inverossímil, mas é só. No elenco que conta ainda com uma Charlize Theron durona e um Guy Pierce irreconhecível, o destaque absoluto que engole todos os outros é o já citado andróide David, encarnado por um inspiradíssimo Michael Fassbender. A ideia era ser uma espécie de homenagem ao personagem de Ian Holm no original. Mas com o olhar de um Hannibal Lecter e citações à "Lawrence da Arábia", Fassbender criou um ser fascinante que é o indiscutível ponto alto do filme. Alguns atores já levaram o Oscar de Coadjuvante por muito menos. Não dá pra ficar indiferente a esse estudo perfeito das emoções humanas.

É por acompanhar de maneira tão interessada e envolvente esse personagem e todo o clima criado que fica tão difícil aceitar o rumo que as coisas tomam. A trama que envolve os "Arquitetos" não é das mais interessantes e a última meia hora é um amontoado de irritantes clichês. Parece que alguém esqueceu de falar "corta, é hora de acabar o filme". Assim, ele fica se alongando demais, até o mais previsível acontecer. Nesse quesito, realmente decepciona um pouco.


Mas agora podemos enfim falar da parte realmente positiva - pelo menos, a meu ver. Desde o início da divulgação do projeto, ficou uma dúvida no ar: "Prometheus" é uma história paralela ao universo de Alien, uma sequência, um filme de origem, o que? Scott anunciou que era "uma ficção científica com o DNA da série Alien". Definiu bem. As referências mais diretas aos acontecimentos de "Alien" são bem discretas. Algumas delas são só para fanáticos mesmo. E se o maior diferencial da série é o incrível e assustador visual da criatura - que, cá entre nós, colocaria medo até nos Homens de Preto -, aqui a galera da direção de arte se supera. Ao invés de fazer o esperado, que seria investir só na figura já consagrada e conhecida, eles fazem o caminho contrário. Vários novos estilos de Aliens dão as caras aqui, um mais interessante que o outro. Isso renova a série, o que é sempre bom. Tudo é assustadoramente bem feito e realista - ou seja, pessoas com estômago fraco podem não gostar muito. Mas é assim que tinha que ser.

Dizem por aí que Ridley Scott deixou alguns buracos no roteiro para explicá-los melhor em uma continuação. Sinceramente, isso seria muito desnecessário. Mesmo. A ideia de um prelúdio já era exagero, mas ok, até que ficou legal.  Agora o melhor é parar por aqui e não arriscar mais, visto que parte do público reagiu muito mal ao filme. O fato é que "Prometheus" entrega tudo que se espera de uma ficção científica, mesmo sem inovar muito o gênero. Em comparação a um "Avatar" da vida, por exemplo, é muito mais original e envolvente. É bem vindo para despertar a atenção da nova geração para um clássico incompreendido do cinema, como um convite feito pelo próprio artista à obra que o consagrou. Scott, inclusive, vai voltar a brincar com a nostalgia alheia em breve, ao dirigir a continuação de seu "Blade Runner". Os fãs, coitados, já começam a temer pelo pior.