terça-feira, 22 de março de 2011

Inteligência Artificial - O atemporal clássico de Fritz Lang, "Metropolis"


O grande salão do Theatro Municipal fica totalmente escuro, dando destaque para um telão onde normalmente fica a orquestra. A música começa discretamente ao fundo, enquanto o filme é nele projetado. A ambientação remete às décadas de 20 e 30, quando ir ao cinema era um programa especial e requintado como é hoje a ida a um concerto. Até a característica música ao vivo estava presente. Impossível não sentir o clima de nostalgia, enquanto o imortal clássico alemão "Metropolis", era exibido a velhos admiradores e a novas gerações da melhor maneira possível. A ótima e inovadora iniciativa foi posta em prática nos dias 21, 22 e 23 do mês de março, com grande e merecida repercussão entre os cariocas.

A publicação dessa matéria uma semana após o evento evidencia que o objetivo do texto não é informar sobre a exibição em si, mas sim mostrar a importância desse filme atemporal e essencial para a história do cinema ( e do homem moderno, de certa forma). Realizado no longíquo ano de 1926 na Alemanha pré-Hitler, esse projeto do brilhante diretor austríaco Fritz Lang era uma direta crítica à exploração do operariado e à disparidade de classes.


A trama em si não é muito complexa: a ação se passa em 2016 e mostra a cidade de Metropolis, que é dividida entre dominadores e dominados até que Freder, o filho do rico Fredersen - o grande mestre de Metropolis - se apaixona pela líder religiosa da "Cidade dos Operários", Maria. Lá, no plano inferior, operários trabalham como escravos para manter a bem-servida decadência de quem mora no plano superior. Fredersen então resolve investir na criação de um robô que receberá as feições dessa jovem, para semear a discórdia entre os trabalhadores. O roteiro assinado por Lang e sua esposa, Thea Von Harbou, também mesclava mitologia nórdica, profecia bíblica, romantismo e sexualidade ao vislumbre apocalíptico do futuro, que se tornou uma das mais célebres ficções científicas da história.

O anterior sucesso de "Os Nibelungos" permitiu ao mestre Fritz Lang(1890-1976) ter plena liberdade em seu novo projeto, uma projeção futurística de um sistema social e político. Lang arquitetou um grandioso projeto que acabou sendo o mais caro feito na Alemanha da época. A UFA - estúdio estatal alemão responsável pelos filmes expressionistas - forneceu um orçamento com o qual poderiam ser feitos 20 (!) filmes normais. O lento retorno financeiro que o filme teve na estréia quase faliu a UFA, mas a fama até hoje mantida prova que seu valor é inestimável.


Mais importante que a história é o modo como ela foi transportada para as telas. O fantástico e inovador legado visual inspirou basicamente todas as ficções científicas posteriores: do clássico Tempos Modernos (1936), passando por Blade Runner - O Caçador de Andróides (1982) até Minority Report - A Nova Lei (2002), todos filmaços de diretores consagrados (Chaplin, Ridley Scott e Steven Spielberg, respectivamente). Os gigantescos arranha-céus da cidade futurista são ainda hoje impressionantes, ainda mais se considerarmos a tecnologia com que foram construídos. O processo de mesclar modelos com o real (herança da formação original de Lang, como arquiteto) criou imagens que não saem da cabeça e que mudaram o jeito de ver cinema. Os aviões voando entre os futuristas edifícios, que foram inspirados no visual da Nova York que o diretor sobrevoara no ano anterior, ainda surpreendem. Sem falar que é desse filme o primeiro robô do cinema, Futura, que inspirou diretamente o C-3PO da saga "Star Wars", também muito pontuada pelo visual de "Metropolis".

Da luta de classe à robotização do futuro, nenhum tema abordado no filme tinha moldado um painel tão desolador do amanhã até então. Além das inovações narrativas, os então inéditos efeitos visuais marcaram o longa. Cenas importantíssimas para a história do cinema estão presentes nessa película: a rápida sequência da Torre de Babel (para a qual mil figurantes tiveram a cabeça raspada), as tomadas que mostram os revoltados operários tomando as ruas como formigas e a delirante dança de Maria (já como um robô) para a alta classe da cidade, intercalada com os delírios macabros de Freder. Mas nada barra as (poucas) cenas envolvendo o robo Futura, principalmente aquelas em que ele ganha as feições de Maria, momento que já entrou para o imaginário popular e cultural.


De todos personagens que desfilam no longa, dois se destacam. O primeiro é o cientista Rotwang, que na caricatural interpretação de Rudolf Klein-Rogge, digna do cinema mudo, acaba se tornando um verdadeiro monstro do grande hall existente no Expressionismo Alemão. E cá entre nós, é a cara do Arnaldo Jabor. O outro personagem é Maria, encarnada pela presença hipnótica de Brigitte Helm(1908-1996), que rouba todo o filme para si. Em cada fotograma que aparece, a atriz de beleza exótica atrai todos os olhares e atenções como um verdadeiro ímã. Sua personagem olha diretamente para a câmera com seus grandes olhos claros - uma inovação para a época - de um jeito que não só intimida os espectadores, mas os faz acreditar estar observando uma pintura (das mais belas).


O longa impressionou tanto Hitler, que Lang foi sondado para fazer filmes propaganda para o nazismo. Isso o levou ao exílio nos Estados Unidos, após realizar sua outra obra-prima: "M - O Vampiro de Dusseldorf" (1931), seu primeiro filme falado. Só retornaria à Alemanha no final da década de 50. Pena é que os 153 minutos originais do filme tenham sido retalhados fora da Alemanha por questões comerciais. Assim, circulam várias versões de diferentes metragens, sendo que poucas ficam à altura da original. O compositor Giorgio Moroder ainda adicionou uma trilha sonora ao filme originalmente mudo em 1984.

Alguns críticos consideram "Metropolis" o filme que melhor representa o Expressionismo Alemão e suas características. O título não é ao todo justo, até por o filme ser ingênuo em muitos de seus aspectos, fugindo da frieza característica de filmes como "O Gabinete do Doutor Galigari" (1919) e "Nosferatu" (1922), esse sim o auge do movimento. O próprio Lang se arrependeu mais tarde de ter resolvido o conflito entre "a cabeça" (os ricos empresários) e "as mãos" (os trabalhadores) com um simples e simbólico aperto de mão ao final do filme. Mas a verdade é que "Metropolis" acabou criando um estilo próprio, onde o visual dos cenários é essencial para o desenrolar da trama. E sua mensagem, de que "o mediador entre a cabeça e as mãos deve ser o coração", é certamente genial e atemporal. E os que ovacionaram o filme ao final da exibição no Municipal, sem dúvida entenderam o verdadeiro espetáculo.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Uma Mente Brilhante - Georges Méliès, o primeiro gênio do cinema


A foto acima é famosa em todo o mundo, ninguém pode negar. Alguns poucos sabem que nela está representada a Lua, mas o que é chocante e triste é que quase ninguém conhece o homem por trás desse filme. Sim, essa imagem é de um filme. E o homem que o fez foi um gênio do cinema antes que essa categoria sequer existisse. Seu nome era Georges Méliès.

O ano era 1895. O cinematógrafo criado pelos irmãos franceses Louis e Auguste Lumière era um sucesso absoluto, mas uma inovação ainda pouco aproveitada. Isso porque a maioria das projeções exibidas na França - berço original do cinema, embora muitos apostem cegamente nos EUA - e que mais tarde ganhariam o mundo, eram de cenas curtas (com cerca de dois minutos) e quase documentais feitas pelos próprios Lumière. É o caso do curta "Le Repas de Bébé", em que o próprio Auguste aparecia simplesmente dando comida para sua filha ainda bebê. Mas o impacto maior veio com a projeção de aproximadamente um minuto que mostrava um trem chegando a uma estação. A câmera ficava a uma distância segura, mas de frente para o trem, e quando ele se aproximou da tela pela primeira vez, o assombro do público foi notável. Méliès, por acaso, estava na pláteia, e percebeu melhor que ninguém essa reação imediata do público. Nesse momento, percebeu que um novo meio de comunicação com as massas fora criado.


O aspecto que despertou o interesse de Méliès desde o início foi a capacidade que ele teria de encantar e brincar com o público, algo que já fazia antes como mágico de sua trupe de teatro. Além disso, somava as funções de ator, diretor, cantor, pintor, cenógrafo, coreógrafo e músico. Também era gênio, mas disso não sabia, e talvez tenha morrido sem que lhe contassem. O fato é que foi ele o primeiro a fazer do cinema a arte da imaginação, e 150 anos depois de seu nascimento, ainda não tem o reconhecimento merecido.

Ao acabar a exibição daquele dia 28 de dezembro de 1985, no Salon Indien du Grand Café de Paris (sua cidade natal), Méliès foi imediatamente até os irmãos Lumière, oferecendo-lhes 10 mil francos pela máquina. Os dois recusaram, pois acreditavam que aquela era apenas mais uma inovação que logo seria superada e esquecida. Sem perder tempo, Méliès pegou um trem até Londres, onde conseguiu comprar um cinematógrafo lá feito.


Em pouco tempo, Georges Méliès já tinha montado o primeiro estúdio de cinema, ainda no século XIX. Tinha teto de vidro, o que permitia que ele controlasse a iluminação das cenas. Na foto acima, ele pode ser visto preparando tudo para uma gravação - é o homem calvo na esquerda. E assim, atores de sua companhia de teatro atuavam diante de cenários muitas vezes pintados por ele mesmo. Desde o começo, Méliès usou truques com a câmera que confundiam e encantavam espectadores por todo o mundo, operando verdadeiros "milagres visuais" onde arrancava sua própria cabeça várias vezes ou a aumentava de tamanho como se estivesse enchendo-a de ar. Por vezes, ele mesmo atuava na frente das lentes, revelando sua faceta de ator e comunicador. É o que podemos ver no vídeo abaixo, que é surpreendente ainda hoje, ainda mais se pensarmos que foi feito em 1900 (!).



Mas a grande revolução viria em 1902. Até então os filmes eram apenas cenas soltas com base narrativa pouco desenvolvida, durando no máximo 5 minutos, o que já era considerado muito. E sessenta e sete anos antes do homem de fato pisar na Lua, Méliès resolveu usar sua criatividade e imaginação para levá-lo até lá. Assim desenvolveu Viagem à Lua (Le Voyage dans la lune, no original), seu filme mais famoso, provavelmente a primeira obra-prima do cinema. Além de ter sido, sem dúvida, a primeira ficção científica da história, foi também o primeiro filme a ter mais de dez minutos! A versão original tinha doze, algo muito ousado para a época. E pela primeira vez foram usados desenhos de produção e storyboards para projetar as cenas. A trama mostrava a reunião de cientistas para decidir a viagem (Méliès participa como o chefe dos pesquisadores), a construção do foguete, a partida dos homens com festas de despedida, a chegada à Lua, o encontro com os primeiros ETs do cinema (chamados de selenitas) e a fuga, às pressas, da forma surreal possível.

Não é preciso muita observação para perceber que tudo é surreal na produção: os astrônomos se vestem como o mago Merlim, a Lua é uma grande floresta onde os pesquisadores chegam de bengala e guarda-chuva, os astros são atores com roupas de estrelas e o foguete, no final, ao cair no mar da Terra, tem peixes muito desproporcionais ao tamanho dos atores (Méliès juntou a cena dos homens com a que fez de um aquário, por isso os peixes parecem gigantes). Mas esses aparentes "erros" acabam dando ao filme sua aura genial, pois foram realizados com poucos recursos e sem a menor hipótese do homem de fato chegar um dia à Lua. E assim, virou patrimônio da humanidade a cena do foguete cravado no olho da Lua, que abre essa matéria.

Eis o link para o filme: http://www.youtube.com/watch?v=7JDaOOw0MEE&feature=related


Após esse filme e seu sucesso mundial, a maneira de se pensar e ver cinema mudou completamente. E a carreira de Méliès começou a declinar. Continuou fazendo filmes até 1910, obtendo grande sucesso com alguns, como a primeira adaptação de uma obra de Júlio Verne, "20.000 Léguas Submarinas", de 1907. Mas gastou muito rapidamente todo dinheiro conseguido, e logo pouco sobrava para a realização de novos filmes. No fim da vida, quase falido, virou dono de uma loja de brinquedos na estação ferroviária de Paris, até morrer em 1938. Fez em vida mais de 500 filmes, mas poucos sobreviveram até os dias de hoje, pois a maioria foi queimada para fazer botas para o exército francês na Primeira Guerra Mundial.

E assim foi dado o pontapé inicial para a história do cinema mundial. No seu aniversário de 150 anos, Méliès é considerado por alguns poucos e justos admiradores como o verdadeiro "pai da sétima arte". Charles Chaplin, ícone máximo do cinema, o chamou de "o alquimista da luz". D. W. Griffith, que viria a ser o primeiro grande diretor, disse que "a ele devia tudo". Justiça seja feita: sem os irmãos Lumière, não teríamos as câmeras e a capacidade de filmar. Mas sem Méliès, não teríamos cinema.

sexta-feira, 11 de março de 2011

Entre Lencóis - A história real de "Bruna Surfistinha" gera polêmicas nos cinemas


Polêmica à vista. Ao assistir "Bruna Surfistinha", a clara mensagem que fica na cabeça é a de que a protagonista foi uma garota de programa que, mesmo tendo sido imoral, drogada e...garota de programa, conseguiu ficar famosa a ponto de que fizessem um filme sobre sua vida. Essa imagem de que ela se deu muito bem fazendo coisas "erradas" incomoda bastante. Mas provavelmente é essa a verdadeira idéia por trás do filme. O problema é que poucos perceberão isso.

As críticas e comentários maldosos já começaram quando o diretor Marcus Baldini anunciou que dirigiria uma livre adaptação do livro best-seller "O Doce Veneno do Escorpião" - a história real da prostituta que, assim como a britânica Belle de Jour um ano antes, decidiu usar a partir de 2004 um blog para narrar o seu dia a dia de trabalho, obtendo enorme sucesso e fama com a iniciativa. Mas a atenção geral se voltou mesmo para o projeto após a atriz global Deborah Secco aceitar viver o papel principal.


Após a liberação do primeiro trailer, o grande público já ficou esperando a estréia de uma espécie de filme pornô disfarçado de grande produção. E, passando-se por cima do preconceito inicial e do senso comum equivocado, vemos que o filme trata sim da vida de uma profissional do sexo, e de forma ousada. Mas a palavra é "ousada", não "explícita". A direção de Baldini permite até alguns (poucos, sem dúvida, mas o que vale é a intenção) momentos de lirismo. Esses são pontuados por cenas silenciosas e fora de foco que marcam a película. Não que isso salve o longa ou o torne um filmaço, mas mostra sua busca pela aceitação do público que evidentemente julgaria o filme, assim como antes julgou o livro. Assim como antes julgou Bruna.

A produção já começa embalada pela charmosa e sensual trilha sonora, ao som de "Time of The Season", do The Zombies. Os créditos iniciais permitem que todos entrem de imediato no clima do que vem pela frente. Polêmica à vista. Um dos grandes erros do filme é mostrar pouco da vida da jovem Raquel Pacheco antes de se mudar da casa dos pais adotivos e escolher a profissão que a levaria ao estrelato. Pelo que é mostrado, não dá pra entender os motivos que levaram a garota de boa família a roubar os pais e se mudar sem aviso prévio para uma nova vida.


Deborah Secco, a princípio, não convence muito como adolescente tímida e ingênua, contracenando com atores claramente mais jovens. Mas ao longo do filme, quanto mais a personagem muda, mais natural fica a sua atuação. No fim das contas, fica claro que a atriz se entregou totalmente ao trabalho, e o resultado é uma grande atuação que será um marco em sua carreira. Deborah nunca esteve tão bela quanto aqui. Independente dos personagens diversos que passam pela história, é ela quem leva o filme nas costas. E faz isso bem, justiça seja feita.

O elenco de apoio tem destaques que merecem ser citados. Um discreto Cássio Gabus Mendes marca presença como o cliente que comete o erro de se apaixonar, sendo o responsável pelas cenas mais bonitas do longa. Fabíula Nascimento, uma das maiores ladras de cena do cinema brasileiro, entrega mais uma atuação inspirada e tem alguns momentos do filme só para ela no papel da escandalosa prostituta Janine. Mas o destaque absoluto vai, sem dúvida, para Drica Moraes. A atriz descobriu sofrer de câncer após o término das gravações, mas começou a sentir os efeitos da doença já no set de filmagem. Mesmo assim, achou forças para entregar uma de suas melhores atuações e, no papel da hilária cafetina Larissa, prova que é uma baita atriz, talvez uma das melhores brasileiras em atividade. É dela o melhor personagem da produção.


PS: Atenção para a participação relâmpago do jogador Dentinho, do Corinthians, como um dos clientes de Bruna.

A trama segue a clássica linha narrativa de "origem - subida ao sucesso - topo -fracasso - redenção", sem muito inovar. Pequenas cenas de humor fazem parte da mistura (destaque para as relacionadas à criação do blog), mas a falta de foco no núcleo familiar é uma falha grave que prejudica o resultado final. Os mais conservadores irão reclamar da grande quantidade de cenas de sexo. O fato é que o filme não tem nem muito nem pouco: ele tem cenas "picantes" na quantidade correta para a temática que explora. Se tivesse menos, soaria muito artificial. O cuidado do diretor em abordar o sexo sem passar dos limites torna o filme mais leve do que obras como "Os Sonhadores", obra-prima moderna do polêmico Bernardo Bertolucci. Mas pérolas como "Fiz isso em amor aos meus pais" e "Hoje eu não vou dar, vou distribuir" provam que, por pouco, o caldo não entorna e o filme se perde em seus excessos.

No fim das contas, concluímos que "Bruna Surfistinha" é um filme tão polêmico quanto dispensável. Não é um grande filme, sem dúvida, mas é o tipo que pode facilmente receber nota 6 em uma escala de 0 a 10. Isso o torna, para o bem ou para o mal, acima da média. De qualquer forma, é o mais próximo que os expectadores poderão chegar do dia-a-dia de uma garota de programa nas telonas do cinema brasileiro, sem ter que para isso pagar o programa completo. É apenas o preço de um ingresso. E estudante paga meia.

quarta-feira, 2 de março de 2011

Enfim, o Discurso dos Reis: Ágil cerimônia do Oscar premia os já favoritos


Agilidade. Essa foi a palavra que resumiu a 83ª cerimônia do Oscar, que a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas entrega anualmente desde 1928, quando premiou o mudo "Wings" como o primeiro Melhor Filme. Essa agilidade é consequência da tentativa de atrair um público maior (e mais jovem) à premiação, o que ficou evidente com a escalação dos queridinhos teens James Franco e Anne Hathaway como apresentadores, representando "a nova Hollywood".

Mas mesmo querendo inovar, o Oscar desse último dia 27 foi bem previsível, abrindo espaço apenas para algumas poucas surpresas, que de fato marcaram a noite. E a primeira delas foi, logo na abertura, um vídeo no qual os dois apresentadores eram inseridos digitalmente dentro de alguns filmes indicados. A brincadeira, que contou com a participação de Morgan Freeman (que sempre tem sua voz narrando algum filme e ali narrava a abertura) e de Alec Baldwin (que fora o apresentador do ano passado), foi muito bem pensada e realizada, e a interação entre apresentadores e personagens ficou muito bem feita. Assim, a festa começou animada e promissora.


O novo visual do cenário e a revisitação a antigos ganhadores do Oscar (começando por "..E o Vento Levou", de 1939), também prometiam emocionar na noite, mas foram artifícios pouco usados no decorrer da cerimônia, o que é uma pena. Outra pena foi o Brasil mais uma vez não ter levado o Oscar, tendo sido indicado esse ano a Melhor Documentário com "Lixo Extraordinário". Pouco chamativo para os americanos, a produção tinha de fato poucas chances, e o favorito "Trabalho Interno" levou.

Como é de praxe, o ator vencedor do prêmio de Coadjuvante do ano anterior sempre apresenta as indicadas ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante. E quando todos esperavam Christopher Waltz (que levou por "Bastardos Inglórios" no ano passado), entrar no palco, eis que anunciam a entrada de Kirk Douglas, primeira grande surpresa da noite. Pai do ator Michael Douglas, Kirk foi um grande galã do cinema americano, tendo chegado a seu auge em 1960 com o personagem título de "Spartacus". O ator, um dos preferidos do diretor Stanley Kubrick (que o dirigiu no filme antes citado e em "Glória Feita de Sanque"), apareceu sem avisar na premiação depois de muitos anos longe dos holofotes. E, aos 94 anos, fez piadas e roubou o show pra si por alguns instantes. O público vibrou mais com sua presença e comentários do que com a esperada vitória de Melissa Leo, pela dura mãe de "O Vencedor". A atriz, fingindo (mal) surpresa, ainda mandou um palavrão ao vivo como se para ver se conseguia ter a atenção de volta para ela.


E assim foram as premiações voltadas para atuações: sem surpresas, atendendo às expectativas e apostas. Christian Bale venceu a dura disputa com Geoffrey Rush pelo Oscar de Coadjuvante, subindo no palco simpático e brincalhão. Quem conhece o seu jeito temperamental, viu ali que ele é de fato um grande ator. Barbudo para a cerimônia, teve ainda a chance de dedicar a estatueta à Dickie Eglund, que inspirou a atuação premiada em "O Vencedor" e estava presente no Kodak Theater.
A linda e talentosa Natalie Portman confirmou o favoritismo e teve seu talento enfim reconhecido pelo papel da bailarina perfeccionista de "Cisne Negro". Com a gravidez já bem avançada, Portman brilhou no palco e se destacou das demais convidadas por sua beleza radiante.
Colin Firth, aparentemente nervoso, subiu mais relaxado para receber seu inevitável Oscar por "O Discurso do Rei". Na hora de anunciar os indicados, a cena mostrada de Firth era exatamente a que, como eu dissera antes, mostrava todo seu talento e entrega ao personagem: o momento em que seu personagem se desespera ao saber que será o Rei da Inglaterra. Nada mais justo.

Mas injustiças também marcaram a cerimônia, principalmente o exagerado prêmio de Roteiro Original para "O Discurso do Rei". Apesar do emocionante agradecimento do roteirista David Seidler, todos os cinéfilos de plantão sabiam que aquela estatueta pertencia à Christopher Nolan e seu genial roteiro de "A Origem". Mas a Academia realmente não é apoiadora do estilo autoral de Nolan, e além de não indicá-lo à Melhor Diretor, tiraram esse Oscar de suas mãos. Algo semelhante aconteceu também com o prêmio de Melhor Diretor, o mais inesperado da noite. O grande favorito David Finhcer já preparava seu discurso de agradecimento quando Kathryn Bigelow (primeira mulher vencedora ano passado por "Guerra ao Terror") chamou o novato Tom Hooper ao palco. O inglês de 38 anos tinha apenas trabalhado na televisão antes de realizar o promissor filme de estréia sobre o rei gago que conquistou Hollywood. O Oscar sem dúvida impulsionará sua carreira. Mas foi um pouco triste ver Fincher, realizador de filmaços como "Clube da Luta" e "O Estranho Caso de Benjamin Button", sair de mãos abanando no projeto que o deixara mais proximo da aclamação. "A Rede Social" ficou com 4 Oscars, mas não os prêmios principais que pretendia.


Outro ponto de discussão foi a fraca atuação da dupla de apresentadores. Enquanto a carismática Anne Hathaway esbanjava animação e entusiasmo no palco, berrando, pulando e cantando, James Franco aparentava estar dopado e mumificado. A química entre os dois só se tornou perceptível na abertura já citada e no momento em que Franco apareceu no palco vestido de Marylin Monroe. O que houve com o animado ator visto em "127 Horas" antes de entrar no palco, ninguém sabe. O comediante Billy Crystal, um dos mais bem sucedidos apresentadores da história do Oscar (foi o anfitrião 8 vezes), fez uma participação especial e os 133 segundos em que tomou conta do palco foram melhores que toda a apresentação dos dois jovens astros juntos. De quebra, em um momento mágico proporcionado pela magia dos efeitos especiais, interagiu com Bob Hope (1903-2003) o maior anfitrião do Oscar, que criou essa "profissão", reprisando o comando da atração 18 (!) vezes.


Os mais atentos perceberam que a festa do Oscar foi mais curta esse ano. Não foi mera impressão: os produtores, temendo pelos índices de audiência, cortaram vários momentos do Oscar e aceleraram muitos outros. A homenagem aos falecidos do ano passado, que normalmente apresenta várias cenas de cada pessoa, esse ano mostrava apenas uma rápida e única imagem de cada um, não prestando o devido tributo a estrelas como Dennis Hopper, Tony Curtis, Leslie Nielsen, Blake Edwards e Patricia Neal. Outra falta sentida foi a entrega do Oscar honorário, que não é mais feita ao vivo, mas em uma "pré-festa" especial. De longe o momento mais emocionante das cerimônias, agora ele se resume a uma rápida exibição da outra festa. Assim, os premiados não tem a chance de agradecer ao vivo por um momento que, de certa forma, esperam há muito tempo. Nesse ano, três foram "agraciados" com o prêmio: o historiador de cinema e documentarista Kevin Brownlow, o grande ator Eli Wallach e o mito Jean-Luc Godard. Francis Ford Coppola ganhou o prêmio Irving Thalberg, especial para produtores, mas como já ganhara vários Oscar na carreira, não precisava de mais esse prêmio. Injustiça maior fom com Wallach, talentosíssimo ator que estrelou vários filmes, como "Os Desajustados" e "Três Homens em Conflito" e nunca fora reconhecido. Agora, aos 94 anos, não teve nem chance de agradecer ao vivo a tardia recompensa. Bem fez o recluso Godard, hoje com 80 anos, que nem apareceu.


E quando começou a passar uma ótima montagem dos 10 indicados a Melhor Filme, logo percebemos que ela era narrada pelo discurso do rei existente no final daquela produção. E nesse momento, podíamos ter certeza de que ele seria o grande vencedor, o que de fato aconteceu.
A iniciativa de juntar todos os vencedores da noite no palco ao final foi bem pensada, porém executada de maneira equivocada. Assim, lá ficaram os vencedores sem reação enquanto um coral de crianças cantava a clássica "Somewhere Over The Rainbow", eternizada por Judy Garland em "O Mágico de Oz".

Mas o ponto alto do Oscar, mesmo que pouco comentado, foi o momento em que Steven Spielberg (um dos "meninos-de-ouro" da Academia) subiu ao palco para anunciar o grande prêmio de Melhor Filme. E do alto de seu prestígio, disse:
"O filme que ganhar esse Oscar hoje entrará para uma grande lista que inclui "Sindicato de Ladrões", "Um Estranho no Ninho", "O Poderoso Chefão" e "Forrest Gump". E os que não levarem o Oscar entrarão para a lista que inclui "Vinhas da Ira", "Cidadão Kane", "Psicose" e "Touro Indomável"."
E com essa simples fala, que foi merecidamente seguida por aplausos, Spielberg declarou um tardio e justo "mea culpa" da Academia a grandes obra-primas que, com ou sem Oscar, entraram para história e mudaram o modo de fazer cinema.

terça-feira, 1 de março de 2011

E o conservador Rei vence o inovador Facebook...


MELHOR FILME:
"O discurso do rei"

MELHOR ATOR:
Colin Firth, "O discurso do rei"

MELHOR ATRIZ:
Natalie Portman, ''Cisne Negro''

ATOR COADJUVANTE:
Christian Bale, "O vencedor"

ATRIZ COADJUVANTE:
Melissa Leo, "O vencedor"

DIRETOR:
Tom Hooper, "O discurso do rei"

FILME DE LÍNGUA ESTRANGEIRA:
"Em um mundo melhor" (Dinamarca)

ROTEIRO ADAPTADO:
"A rede social"

ROTEIRO ORIGINAL:
"O discurso do rei"

ANIMAÇÃO:
"Toy Story 3"

DIREÇÃO DE ARTE:
''Alice no país das maravilhas"

FOTOGRAFIA:
''A origem''

MIXAGEM DE SOM:
''A origem"

EDIÇÃO DE SOM:
''A origem"

TRILHA SONORA ORIGINAL:
''A rede social" , Trent Reznor e Atticus Ross

CANÇÃO ORIGINAL:
''We belong together'', de ''Toy Story 3" : Randy Newman

FIGURINO:
''Alice no país das maravilhas''

DOCUMENTÁRIO:
''Trabalho interno''

CURTA DOCUMENTÁRIO:
''Strangers no more''

EDIÇÃO:
''A rede social"

MAQUIAGEM:
''O lobisomem"

CURTA DE ANIMAÇÃO:
''The lost thing''

CURTA-METRAGEM:
''God of love''

EFEITOS VISUAIS:
''A origem"