quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

A Grande Virada - O boxe (e Christian Bale) conquista os cinemas com "O Vencedor"


Sejamos sinceros: o trailer de "O Vencedor" anunciava apenas mais um filme sobre um lutador sonhador que apanhava mais na vida do que nos rinques, história já vista em filmes como "Rocky - Um Lutador" (1976) e "Menina de Ouro"(2003), ambos vencedores do Oscar de Melhor Filme. Mas desde o "sub-gênero" ter chegado ao auge com a obra-prima de Martin Scorsese "Touro Indomável"(1980), a fórmula veio se repetindo e desgastando. Logo, não se esperava muito dessa nova produção protagonizada por Mark Wahlberg.

E não era só o público que tinha essa impressão. Vários diretores e estúdios recusaram o projeto, que seria originalmente dirigido por Darren Aronofsky, arquiteto da volta de Mickey Rourke com "O Lutador" em 2009. Mas Aronofsky não levou fé na idéia, e a abandonou para fazer o espetacular "Cisne Negro". Assim, quando Mark Wahlberg assumiu uma das cadeiras de produtor, o filme foi cair nas mãos do diretor David O. Russell, amigo do ator. Começou assim a terceira parceria entre os dois, que já trabalharam juntos anteriormente em "Três Reis" (1999) e "Huckabees - A Vida é uma Comédia" (2004).


Na trama, uma história real ocorrida em 1993, Micky Ward (Wahlberg) tenta a sorte no mundo do boxe, sendo treinado por Dicky (Christian Bale) , seu irmão ex-lutador, e empresariado por Alice (Melissa Leo), sua mãe. Só que a família sempre o coloca em segundo plano em relação a Dicky, o que impede Micky de ascender no esporte. Com Russell no comando, o filme deixou de ser focado no boxe em si e passou a ser sobre a problemática família. Esse é o grande trunfo do filme, que excede as espectativas graças unicamente ao magnífico elenco, o que justifica as sete indicações ao Oscar, (incluindo Melhor Filme), sendo três delas direcionadas às atuações.

Wahlberg pouco surpreende em um papel parecido aos que já está acostumado a interpretar, nesse filme que é roubado pelos personagens "secundários". Em um papel antes recusado por Emily Blunt, Amy Adams, a ruivinha que normalmente é ligada a papéis leves e engraçados, mostra aqui seriedade e talento ao dar vida à sofrida e forte Charlene, em atuação nomeada para Atriz Coadjuvante. Melissa Leo, indicada à Atriz ano passado por "Rio Congelado", parece ser aposta certa ao prêmio de Coadjuvante por sua Alice, a mãe interesseira do clã de lutadores, que não aceita a idéia de não ser a agente do próprio filho. Pela personagem, a talentosa Leo, que realmente entra na personagem, desaparecendo em suas roupas e peruca, vem ganhando todas as premiações recentes, o que explica seu favoritismo. Algo semelhante acontece com Christian Bale, que rouba todo o filme para si no papel de Dicky Ecklund, que teve seu auge ao enfrentar o campeão mundial Sugar Ray Leonard, vivendo até então desta fama, apesar de ter desperdiçado a carreira devido às drogas. Como o próprio pôster indica, o filme é de Bale, que realmente personifica o decadente lutador. Durante os créditos finais, uma rápida cena de arquivo prova porque ele merece esse Oscar de Ator Coadjuvante mais que qualquer um, tendo tudo para ser "o vencedor" esse ano.


Apesar de alguns quadros e ângulos serem (muito) parecidos com outros vistos em "Touro Indomável" nas cenas de luta, grandes cenas pontuam o longa. O destaque fica para três trechos que resumem bem o que é o filme: o acerto de contas das irmãs do protagonista, uma pior que a outra (uma verdadeira gaiola de loucas), com a namorada que estaria o afastando da família; a luta que serve como virada na carreira de Micky e a reação de cada um dos personagens ao documentário televisivo que contaria a trajetória de Dicky. Cenas fortes, bem executadas e que justificam o destaque dado pela crítica ao longa.

O uso de câmeras diferenciadas nas cenas de luta dão um tom mais realista à trama, pois a imagem fica semelhante a que é exibida nos canais profissionais do esporte. A trilha sonora inspirada também ajuda a embalar o desenrolar da história, que conquista o espectador que só consegue ver na tela pessoas reais com problemas reais. "O Vencedor" (The Fighter, no original) é um filme direto, que mostra todo o necessário para o completo entendimento da história, sem deixar nada subentendido. É assim um entretenimento eficaz que emociona e envolve, sem ter pretenções maiores do que essas.