segunda-feira, 22 de outubro de 2012

"Em Busca da Terra do Nunca" - Wes Anderson Pinta um Quadro da Adolescência no Lírico "Moonrise Kingdom"


Wesley Wales "Wes"Anderson é um cara excêntrico. Basta ver ou ler qualquer entrevista dele para ter certeza disso. Logo, nada mais justo do que seu cinema e personagens também serem. Isso que o cineasta americano é: o atual "rei das famílias e personagens disfuncionais" no cinema. Tal característica está presente em todos seus filmes, é só conferir. "Os Excêntricos Tenenbaums", "A Vida Marinha Com Steve Zissou", "Viagem a Darjeeling" e até mesmo a animação "O Fantástico Sr. Raposo" são produções que contam com grande elenco em tramas bizarras repletas de humor negro - que viram instantaneamente "cults". Quando Anderson anunciou um novo projeto, essas marcas já eram esperadas pelos fãs de seu trabalho. Alguns até já falavam, com preconceito, que "lá vinha mais do mesmo". E eis que surge "Moonrise Kingdom".

Deixando de lado os termos técnicos e sérios de um crítico de cinema, vamos direto ao assunto: QUE FILME BONITO! Tudo bem, todo mundo já sabe que tipo de filme esperar de Wes Anderson. E sim, está tudo lá, como o esperado. Mas quando a tela ligeiramente granulada toma a sala de cinema de assalto, com imagens que parecem verdadeiras pinturas em movimento, é impossível não ser puxado para aquele universo tão singular e curioso. Os estilosos créditos iniciais, o som de uma doce música clássica ao fundo, a direção de arte espetacular, o uso de cores e movimentos de câmera que chegam a lembrar Stanley Kubrick... Tudo funciona às mil maravilhas. E o público percebe quando dá certo. O resultado é um deleite visual, um suspiro que se mantém durante toda a projeção.


A tema aqui é a adolescência, com todos seus dramas e anseios. O roteiro é um primor, onde os personagens e acontecimentos vão sendo apresentados sem nenhuma pressa. Quem conhece Wes Anderson sabe que seus filmes têm um andamento próprio. Mas isso não prejudica o produto final. Temos um longa-metragem redondo, de 94 minutos, que apesar de parecer meio corrido em certos momentos, nunca parece lento demais. Pode-se dizer, inclusive, que é seu filme mais acessível ao grande público. 

O elenco, como era de se esperar, é um destaque à parte. O diretor volta a trabalhar com os queridinhos Jason Schwartzman e Bill Murray, mas isso é mero detalhe. Schwartzman tem um papel bem curto, enquanto Murray dessa vez não tem a chance de brilhar com seu personagem apagado e pouco relevante. Mais marcantes são as novas aquisições da galeria astros que Anderson dirigiu: um Bruce Willis longe da figura de herói imortal que o consagrou, Edward Norton estudando seu talento cômico e Tilda Swinton em uma ponta de luxo. Até um envelhecido Harvey Keitel dá as caras em uma participação especial. Mas o destaque absoluto, claro, vai para os jovens do elenco. Afinal, relembrando: é um filme sobre adolescência.

Sabe todos os clichês sobre o primeiro amor e suas descobertas? É meio inevitável fugir deles, devemos admitir. Mas merecem palmas os diretores que conseguem dar uma nova solução e abordagem a esse momento com o qual todos nos identificamos. É o que acontece aqui. Os acontecimentos de "Moonrise Kingdom" podem parecer um pouco exagerados ou surreais em certos momentos. Mas por trás daquilo, está a velha história de um garoto e uma garota se descobrindo e lutando para ficar juntos. Os atores Kara Hayward e Jared Gilman - que é a cara da Tilda Swinton... Será que é o filho dela? - estão perfeitos e marcantes em suas interpretações. A dupla é puro carisma. E a escolha a dedo de cada um dos escoteiros só ajuda na fórmula final. Se é o elenco adulto e consagrado que dá credibilidade ao projeto, é o elenco infanto-juvenil que injeta alma em cada fotografa. 


No decorrer das ações que movem o filme, percebemos mais e mais que os adultos parecem perdidos e confusos no mundo que deveria ter neles uma figura de autoridade. São as crianças que tomam as grandes decisões e iniciativas narrativas. Durante toda a projeção, elas têm postura de adultos, às vezes até violentas. Mas elas precisam dessas posturas para conseguir sobreviver ao ambiente em que estão.  Ao mesmo tempo em que parecem buscar uma "Terra do Nunca" onde possam viver para sempre, distantes de tudo, eles precisam antes saber viver naquele mundo do qual querem fugir. Desse ponto de vista, o filme vai além da questão amorosa da adolescência, se apresentando como um filme sobre o amadurecimento - tanto dos adultos quanto dos mais jovens.

Não bastassem os conflitos identificáveis da trama envolvente, a trilha sonora de Benjamin Britten só facilita a viagem. E a direção de arte é a cereja do bolo. Antes de qualquer coisa, "Moonrise Kingdom" é um filme bonito de se ver, composto por imagens que falam sozinhas. Alguns fotogramas gritam para virar quadros, de tão líricos e inspirados. Perto do final da projeção, a câmera vai se afastando da casa com a mesma discrição com que entrou no início. Nesse momento, a garota, Suzy, lança um discreto olhar para câmera enquanto a câmera emula uma espécie de "Adeus" àquele universo maravilhoso que visitamos. É nesse momento que nos lembramos, timidamente, o porquê de irmos ao cinema. É o momento em que sentimos a magia de entrar e sair de um "mundo novo", acessível apenas através de uma sala escura com uma projeção. Todo diretor que consegue despertar isso em pelo menos um espectador já é digno de prêmio. Ou seja, e basicamente: palmas para Wes Anderson.