quarta-feira, 27 de junho de 2012

Irmãos de Sangue - Tim Burton e Johhny Depp Engatam Oitava (!) Parceria com "Sombras da Noite"


A saga "Crepúsculo" fez mais do que apenas acabar com o charme dos vampiros no cinema. Ela abriu caminho para que eles voltassem a ficar na moda, através de inúmeras produções repletas de efeitos especiais e ação. Apesar de alguns resultados acima da média, como a nova versão de "A Hora do Espanto", a maioria dos filmes não fazia jus às marcantes obras-primas protagonizadas pelos dentuços no passado. E é aí que entra Timothy William Burton, mais conhecido pelos cinéfilos como Tim. Dono de uma criatividade visual única, Burton não vinha usando seu potencial criativo desde "Sweeney Todd: O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet", o último filme que tem sua marca autoral da primeira à última cena.

Depois de decepcionar metade do mundo com sua burocrática versão de "Alice no País das Maravilhas", Burton resolveu se voltar para algo mais pessoal. E para isso, chamou seu parceiro de costume: Johnny Depp, como não podia deixar de ser. Tudo começou no meio de uma conversa em 2007, ainda nos bastidores de Sweeney Todd, quando Burton e Depp perceberam que cresceram assistindo um mesmo seriado de televisão. A série em questão era a inglesa e obscura "Dark Shadows", que foi produzida entre 1966 e 1971. É até hoje pouco conhecida, mas sua trama não importa muito aqui, pois os dois deixaram bem claro que a nova versão para as telas seria uma livre interpretação daquela trama.


Assim chegamos a "Sombras da Noite", a oitava parceria entre Burton e Depp. E o resultado final é extremamente superior à visão de Alice pela dupla. Mas é melhor acalmar os ânimos: trata-se de um clássico exemplo de "filme de Tim Burton" - quase um gênero à parte, percebam -, com todos seus altos e baixos. Quanto mais investem no visual, mais seus filmes acabam se perdendo em uma narração muito presa a um estranho "tom de fábula". Foi assim com "A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça" e até mesmo com "A Fantástica Fábrica de Chocolate". Só que aqui tinha tudo para dar certo, pois se trata do choque de um mundo bizarro e estilizado (característico de Burton) com o tradicional mundo real. Foi com esse mesmo choque que o diretor realizou suas obras-primas máximas, "Edward Mãos-de-Tesoura" e "Os Fantasmas Se Divertem". Só que o lirismo e genialidade deles não dá as caras por aqui.

O filme faz uso de uma desnecessária introdução em flashback para apresentar o protagonista: Barnabas Collins, um rico aristocrata inglês que é transformado em vampiro após seduzir e partir o coração de Angelique Bouchard (Eva Green), uma atraente e vingativa bruxa. Ela joga a população da cidade local contra ele e o faz ser enterrado - a deixa para a trama avançar até 1972, onde de fato começa. E pelos discretos créditos iniciais, já notamos que temos aqui um Tim Burton em versão mais comportada. O visual geral é bem "normal" para o nível dele, e seu estilo gótico tão marcante e adorado só dá o ar da graça em alguns poucos detalhes do Castelo da família Collins.


O elenco é repleto de rostos conhecidos, nem sempre bem aproveitados. Jack Earle Haley (o hilário caseiro Willie) e Jonny Lee Miller (o interesseiro Roger Collins) são dois atores muito talentosos que têm carisma de sobra para dar a qualquer filme, mas pouco o que fazer em cena com personagens pouco carismáticos ou relevantes. Michelle Pfeiffer, que volta a trabalhar com o diretor após da brilhante e insuperável Mulher-Gato de "Batman - O Retorno", aparece aqui em versão super canastrona e a promissora Chloë Moretz em certos momentos não se encaixa muito bem no papel da rebelde Carolyn. Helena Bonham Carter brilha como uma psicóloga alcoólatra e
Bella Heathcote tem um rosto de beleza marcante que dá uma aura angelical ao interesse amoroso do vampiro de Depp.

O Barnabás Collins de Johnny Depp é um caso à parte. Grande "objeto estranho" em torno do qual gira todo o filme, ele tinha tudo pra ser mais um show de exageros do ator - vide o que ele fez com o Chapeleiro Maluco. Mas Depp acha o tom e cria um personagem interessante, com ecos de ícones do horror: o visual e as mãos são de Nosferatu (da obra-prima muda de 1922), enquanto o gestual é muito inspirado em Bela Lugosi (o Drácula eterno, do clássico de 1931). Até Christopher Lee, lenda viva que já interpretou o Drácula diversas vezes, faz uma participação no filme, aos 90 anos. Enfim, o personagem de Depp diverte e é um "vampiro das antigas", para a alegria da nação. Fazendo dupla com ele, vemos uma (sempre) linda Eva Green, exagerada na medida certa como a bruxa Angelique. Juntos, eles têm uma inspiradíssima cena que já fez sucesso no trailer, e é ainda melhor no filme.


Agora, verdade seja dita: Burton aproveitou pouco as possibilidades de brincar com a década de 70, cujas características renderiam muitas cenas cômicas. Nesse sentido, ele investe em um humor mais fácil que até funciona - como é o caso da inspirada cena em um acampamento hippie -, mas decepciona um pouco. A trilha sonora resgata alguns clássicos meio perdidos da época, que dão um clima agradável ao filme. Para se ter uma noção, o roqueiro Alice Cooper em pessoa aparece no filme, em uma participação MUITO estranha - afinal, ele aparece envelhecido em... 1972. Isso tudo para Burton abrir mão de qualquer sutileza na parte final, jogando no espectador tudo que se espera de um filme dele, de uma vez só.

Mas "deixando os entretantos de lado e partindo para os finalmentes", sejamos justos: "Sombras da Noite" tem seus momentos de diversão. Pode até deixar um gostinho de quero mais, mas diz a que veio.  Os fãs mais fervorosos do trabalho de Tim Burton podem estranhar um pouco o burocrático e comportado resultado final, mas os de Depp não terão do que reclamar. Quanto aos góticos e "burtonianos" de plantão, podem ficar tranquilos: se "Dark Shadows" não saciou sua sede, aguardem até o dia 2 de novembro. É nessa data que estreia "Frankenweenie", um remake que o próprio diretor fará de um curta lançado por ele em 1984. A animação, em Stop-Motion, Preto e Branco e 3D, tem o visual que remete aos clássicos "O Estranho Mundo de Jack" e "A Noiva Cadáver". Ao que tudo indica, essa sim será uma obra com total marca autoral e criativa do Tim Burton que conquistou e inspirou tanta gente.