quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

"Brazilian Pie" - Novo filme brasileiro "Desenrola" os dilemas da adolescência


"Filme brasileiro? Tô fora!" Essa é, infelizmente, a reação da grande maioria dos adolescentes em relação a estreias do cinema nacional, tendo sido os dois "Tropa de Elite" raras exceções. Por isso, é arriscado fazer um filme voltado exatamente para esse público, o que ficou bem claro com a morna recepção do competente "As Melhores Coisas do Mundo", de Laís Bodanzky. Mas "Desenrola" tenta a sorte mostrando que é possível fazer um filme sobre adolescentes que os agrade, sendo feito, nesse caso, por eles mesmos.

O projeto da diretora Rosane Svartman, nascida em Memphis, EUA, era de fazer um filme derivado da série de TV "Quando Éramos Virgens", que foi criada por ela mesma em 2006. A partir daquela ideia, Rosane visou desenvolver o roteiro escrito por ela e Juliana Lins. Mas isso só poderia ser feito com a ajuda do público alvo em questão. Assim, o roteiro foi submetido a jovens de escolas do Rio de Janeiro e São Paulo, que, através das suas observações e sujestões, ajudaram a diretora a chegar ao resultado final que pode ser visto nas telas.

A perda da virgindade, assunto tratado várias vezes no cinema, como na famosa cinessérie "American Pie"(que depois do terceiro capítulo, virou um besteirol sem sentido) e "Superbad - É Hoje!", é aqui mostrada de forma inteligente e delicada. O ponto de vista feminino pode até afastar os garotos menos avisados, mas o longa agrada aos dois sexos, de maneira equilibrada. Não é um "filme para garotas" ou "filme para garotos", e sim um "filme para jovens".


O elenco foi selecionado depois de inúmeros testes, sendo a maioria de novatos no cinema. O papel da protagonista Priscila ficou com a linda Olívia Torres, que já participou de "Malhação" e é cantora. Com sua beleza e ingenuidade, mostra ser a melhor atriz em cena e tem tudo para ter uma grande carreira no ofício. Apesar do "destaque" da produção ser a participação de Kayky Brito, que faz a paixão platônica da personagem, seu personagem só está ali para aparecer sem camisa (o que deve atrair o público feminino) e o ator sempre parece estar bêbado em cena, encarnando a clássica imagem de "playboy".

Apesar de o filme ser, sem dúvida, de Olívia, quem rouba a cena é a dupla vivida por Lucas Salles e Vitor Thiré. O primeiro faz o sarcástico Boca, o "gordinho palhaço" que todo mundo conheceu um dia, que no meio de tantas gozações e piadas, acaba se encantando pela timidez e pureza de Priscila. Já Thiré faz Amaral, o clássico "amigo bobo" que existe em todas as salas de aula, estando sempre lá para...fazer alguma piada de mal gosto. Os dois protagonizam as cenas mais engraçadas do filme, que garantirão a alegria da ala masculina do público, com suas conversas francas sobre garotas, sexo...enfim, sobre o dia-a-dia. E atire a primeira pedra aquele que não se identificar com os sinceros diálogos que ocorrem entre os dois, que roubam tantas cenas que já garantiram uma série própria no canal Multishow, chamada "Desenrola Aí".


Como se trata de um filme brasileiro, as participações especiais de famosos não poderiam ficar de fora. Mas as únicas que têm sentido são as de Cláudia Ohana e Marcelo Novaes, que fazem os divertidos (e realistas, afinal MUITOS irão se identificar com o jeito dos dois) pais divorciados da personagem principal. Pedro Bial faz uma tímida participação como o professor que propõe o trabalho que "desenrola" a trama, mas Juliana Paes é totalmente dispensável em sua participação de 30 segundos (e duas falas) como a tia de Amaral. Assim como o comediante Smigol, que se não fosse a menção nos créditos finais, sequer seria reconhecido no papel de um vizinho do Boca. Mas sem dúvida, é bem melhor do que "Muita Calma Nessa Hora", que, pela história e número de "aparições especiais", parecia mais um especial da Globo ou da MTV, sendo um "projeto de filme".

Não bastando a leve e realista abordagem, montagem dinâmica ou personagens interessantes, o filme pode ainda agradar pela trilha sonora que, ainda que perdida em "sucessos" recentes e pouco inspirados, teve a idéia de voltar com hits dos anos 80, pela boa sacada do roteiro. Assim, o público pode entrar na história ao som de Paralamas do Sucesso, Legião Urbana (numa inspirada versão da belíssima "Quase Sem Querer") e, principalmente, Simple Minds, com a maravilhosa e atemporal "Don't You Forget About Me", que já embalou e ainda pode embalar muitos romances. Jimmy Kerr, vocalista da banda, faz ainda uma especialíssima participação no final da película.


Apesar de algumas cenas desnecessárias e da duração (afinal, estamos falando de apenas 88 minutos), "Desenrola" é um filme que mistura ficção e realidade divertindo na maior parte do tempo. Visto por adolescentes, pode abrir a visão desses em relação a temas decorrentes do cotidiano, como o uso de camisinha e gravidez na adolescência (não exatamente nessa ordem), além de tratar do inevitável clima de romance que as vezes rola entre amigos. Poucas vezes a tela de um cinema parece tanto o espelho de uma geração, ainda mais em uma produção nacional. Resumindo a história: "Desenrola" é um filme que, antes de ser adorado ou odiado, merece ser visto. Não é uma obra-prima, mas prova que há um futuro promissor para o cinema brasileiro, que depende do interesse desses jovens para poder, junto a eles, desenrolar e crescer.