domingo, 17 de março de 2019

Caçadores do Ídolo Perdido - As Vidas e Aventuras de Paul Fejos





Onde está Paul Fejos? A pergunta é simples e direta.

Talvez você nunca tenha lido sobre esse nome, o que infelizmente é esperado. Permita que eu o apresente. Nascido na Budapeste de 1897, Pál Fejös desenvolveu paixão precoce pelo Teatro. Logo decidiu: era aquilo que iria fazer, se tornaria um diretor teatral. A família conservadora imediatamente cortou o barato e lhe exigiu um diploma "sério". Ele acatou e jogou pesado: se formou em medicina (!). Canudo em mãos, se despediu dos parentes e partiu para os Estados Unidos - era hora de focar em seu sonho. Rapidamente foi parar em Hollywood, lugar que pessoalmente nunca lhe causou simpatia. Não demorou para chamar a atenção de diversos produtores, por seu modo inventivo e rápido de gravar. 

Fejos foi uma figura ativa e requisitada no final da década de 20. O pouco tempo no coração da indústria foi o suficiente para uma obra-prima inquestionável: "Lonesome", um dos tesouros periods mais valiosos da fase silenciosa do Cinema. Feito na exata transição entre o Mudo e os "Talkies", é um híbrido, uma obra experimental, inovadora e absurdamente romântica. Em pouco mais de uma hora, resume todo potencial ecoante e mágico do Cinema. Ele ainda faria o denso "The Last Performance", explorando ao máximo a imensidão do olhar icônico de Conrad Veidt, e o ambicioso "Broadway", primeiro longa falado a custar mais de um milhão de dólares (!!). Os três títulos citados, todos realizados no mesmo ano 1929 (!!!), já seriam suficientes para lhe reservar um lugar no panteão de gênios da imagem. Não parou por aí. Saudoso do clima europeu e já esgotado das excentricidades americanas, Fejos largou tudo no auge do sucesso. Preferiu experimentar as possibilidades narrativas do som na França - onde dirigiu o luxuoso "Fantômas" (1932), remake de filmes de suspense pioneiros da década de 10. 



Depois de anos gravando na Dinamarca, se cansou de trabalhar com ficção e histórias comerciais. A companhia Nordisk Film reconhecia sua grandeza e lhe garantiu total liberdade criativa, desde que não os abandonasse. Maroto, Fejos indicou que só teria interesse em filmar locações ainda inexploradas. Diante de um grande mapa, arriscou apontar para a ainda semi-desconhecida região de Madagascar. Para sua surpresa, dito e feito! Com a benção e investimentos dos produtores, lá foi ele com uma equipe corajosa e reduzida. Entre 1935/36, se inseriu em tribos e aldeias ancestrais, onde desenvolveu um valioso olhar documental. Fascinado pela simplicidade e pureza daquelas civilizações, acompanhou suas rotinas e rituais de perto. As imagens e registros ali feitos cruzariam o mundo em diversos eventos acadêmicos de Antropologia e História. Contagiado por essa descoberta de "novos mundos", Fejos demonstrou interesse em explorar áreas isoladas da América do Sul. Ao longo de ousadas viagens pelo Peru, Fejos liderou expedições por 18 cidades incas até então perdidas - descobriu e registrou tudo para a posteridade. Seu material visual e etnográfico teve importância absurda para o século XX. Tocado pelo tanto que vivenciou através do contato direto com diferentes povos e culturas, Paul Fejos dedicou os últimos anos de sua vida à Antropologia. Abandonou as câmeras e as viagens para se tornar Diretor de Pesquisa da Wenner-Gren Foundation. Respeitadíssimo no meio, foi professor nas universidades de Stanford, Yale e Columbia. 

Cineasta, Doutor, Explorador e Antropólogo - basicamente um Indiana Jones com uma câmera! Um húngaro, estrangeiro em Hollywood e em quase todos países que viveu, que conduziu o olhar curioso de sua câmera inquieta para a descoberta de novos mundos. Só que você não ouviu falar dele. Nem mesmo cinéfilos dedicados, estudantes dessa Arte, chegam facilmente ao nome de Fejos. Muitos de seus filmes simplesmente se perderam. Os pouquíssimos hoje catalogados e difundidos por seletos grupos foram redescobertos e restaurados por pesquisadores apaixonados do Festival Italiano de Pordenone ou da Criterion Collection. Ele é mais um exemplo cruel de como o imaginário coletivo pode enterrar, quase completamente, o legado de ídolos desconhecidos. Onde estão os merecidos tributos? As exibições públicas para difundir a sutileza visual de sua Arte? Os cursos e palestras sobre sua contribuição para a cultura num sentido muito mais amplo? Onde está seu nome entre tantas figuras fascinantes do século passado? Não que esse humilde texto ajude em muita coisa, é claro. Porém, de forma plenamente sincera e apaixonada, deixo aqui a inquietante pergunta: 

Onde está Paul Fejos ?